“Temos de matar um leão por dia”, diz Claudio Botelho

O jornal Valor Econômico traz, nesta semana, uma entrevista com o diretor Claudio Botelho. Leia a entrevista na íntegra abaixo:

O jornal Valor Econômico traz, nesta semana, uma entrevista com o diretor Claudio Botelho. Leia a entrevista na íntegra abaixo:

 

“Temos de matar um leão por dia”, diz Claudio Botelho

O diretor teatral Claudio Botelho, de 48 anos, que ao lado de Charles Möeller, é um dos principais nomes do musical no Brasil, diz que alguns espetáculos são pretexto para que o público ouça “um pouco mais do mesmo”. Para ele, o sucesso dos musicais se deve ao fato de a linguagem usada ser acessível a todos, e não apenas para a classe teatral.

Valor: Como você avalia essa explosão de musicais no Brasil?

Claudio Botelho: O público estava afastado do teatro em geral porque o teatro no Brasil se direcionou para espetáculos herméticos, os chamados “espetáculos de diretor”, textos de interesse acadêmico ou de exercício intelectual distante do público comum. Quando os musicais começaram a aparecer, em torno do ano 2000, o público viu a possibilidade de ter entretenimento no teatro. Entretenimento de qualidade, garantia de diversão, e comunicabilidade com a plateia. Não importa se um musical é uma produção milionária, “Um Violinista no Telhado”, ou barata, “Milton Nascimento – Nada Será Como Antes”, o que vale é que o público sabe que vai pagar para ver algo que foi feito para ele e não para a classe teatral ou para pequenos segmentos que não lotam nem um teatro de 500 lugares.

Valor: Apesar de alguns sucessos internacionais, você acha que existe tendência de musicais mais próximos à cultura brasileira?

Botelho: Não vejo o teatro nem a música como algo que deva ter identidade local, nacional, ou mesmo de gênero. Ninguém se pergunta por que se faz tanto Verdi, Puccini e Stravinsky em salas de concerto. Muito menos por que o mundo reverencia a “Mona Lisa”, Picasso, Renoir. Teatro é teatro. No Brasil não há compositor escrevendo para o teatro, ou pelo menos nenhum nome de peso se dedicando a esse segmento. Montar musicais sobre a vida de artistas é um caso à parte, me parece mais pretexto para que o público ouça “um pouco mais do mesmo”, isso não é teatro musical.

Valor: O musical “Tim Maia – Vale Tudo” foi um divisor de águas, mexeu com esse mercado?

Botelho: Não assisti ao musical “Tim Maia”.

Valor: Por que o conteúdo nacional interessa tanto o mercado neste momento?

Botelho: O que interessa é conteúdo que tenha química com o público. “A Família Addams” não tem nada a ver com o Brasil e é um enorme sucesso. “Um Violinista no Telhado” fala sobre judeus na Rússia do czar e foi um dos maiores sucessos, de verdade, dos últimos anos no teatro musical. A “Ópera do Malandro”, que montamos em 2003, ficou três anos em cartaz no Rio, São Paulo e Portugal. Mas não porque é brasileiro, e sim porque é bom e foi bem montado.

Valor: Qual a grande dificuldade do espetáculo “Milton”?

Botelho: O grande desafio foi evitar usar o texto falado ou contar histórias pessoais do Milton, para colocar o espetáculo em cena. Nossa intenção era mostrar Milton através da obra, os vários Miltons dentro de sua obra.

Valor: Esse tipo de espetáculo seria biográfico? Como o definiria?

Botelho: Não gostamos de espetáculos biográficos, salvo raríssimas exceções. Nossa ideia aqui é tratar da obra, não da vida do compositor.

Valor: Quantas pessoas têm recebido em média por apresentação desse espetáculo no Rio?

Botelho: No teatro Clara Nunes recebemos uma média de 450 pessoas por espetáculo. O teatro tem 500 lugares. Temos quase 90% de ocupação, o que é extraordinário.

Valor: Vocês estavam como parceiros da T4F, também foram da Aventura e agora estão na Geo. Isso significa também que o mercado está aquecido?

Botelho: O mercado está muito aquecido, não há dúvida. Trabalhei na T4F como versionista e autor de letras desde o ano 2000, com “Les Misérables”. É uma produtora amiga, competente e tem excelentes profissionais. Fomos sócios da Aventura quando ela nasceu e dirigimos ali alguns grandes espetáculos. Por diferença de pensamento artístico, nos desligamos da Aventura e recebemos o convite para assumir o departamento de teatro da GEO. Não acho que tenhamos sido disputados por nenhuma empresa. Em nossa carreira é preciso estar atento para não deixar de entender que temos de matar um leão por dia para continuar trabalhando.

Fonte: Valor Econômico – 23/01/13.