Ator é único homem entre poderoso elenco feminino no espetáculo, em cartaz na capital paulista
Nascido em Gênova, na Itália, Nicola Lama, de 38 anos, sempre soube que queria seguir a carreira artística, mas foi só quando se mudou para o Brasil, há 10 anos, que seu sonho realizou de fato. E este ano ele conquista mais uma importante meta de sua vida: interpretar Guido Contini no musical Nine, papel que já foi desempenhado com louvor por Raul Julia e Antonio Banderas, na Broadway, Daniel Day-Lewis, no cinema, e Marcello Mastroianni, este como Guido do longa 8 ½, de Frederico Fellini, que inspirou o musical.
Na pele do perturbado cineasta italiano com bloqueio criativo, Nicola seduz a plateia e o grandioso elenco feminino que o rodeia. Entre elas, as poderosas Totia Meireles, Carol Castro, Malu Rodrigues, Letícia Birkheuer, Myra Ruiz e a dama do teatro brasileiro Beatriz Segall. “A primeira vez que ensaiamos a música de abertura, e dei conta que estava vivenciando uma coisa absolutamente rara. Foi um choque, lindo, emocionante”, conta ele, que abriu seu camarim para a QUEM e falou sobre sua trajetória até chegar aos palcos do Teatro Porto Seguro, em São Paulo, na versão brasileira do premiado espetáculo da Broadway, aqui chamado Nine – Um Musical Felliniano, dirigida pela dupla Charles Möeller & Claudio Botelho.
Confira a entrevista:
QUEM: Como foi parar em – Um Musical Felliniano?
Nicola Lama: Eu fiquei sabendo durante um trabalho que Charles (Möeller) e o Claudio (Botelho) estavam com os direitos do musical, em 2009, e isso foi para mim foi uma iluminação, uma epifania, e pensei: ‘Preciso que eles me conheçam!’ Assim, fui para as audições de Um Violinista no Telhado e me apresentei com a Guido’s Song, música principal do Guido Contini. A ideia era mostrar para eles: sou italiano, canto essa música, pensem a respeito. Mas, na época, eu fiz audição para um personagem e acabei passando. E assim começou a nossa história. Foi o primeiro trabalho que fizemos juntos e foi maravilhoso. A partir disso entrei em outro musical deles, O Mágico de Oz, em SP e no Rio, e em seguida Os Saltimbancos Trapalhões. Mas Nine continuava presente e virou meu sonho, meu objetivo, onde eu queria chegar.
Q: Mudou algo em sua vida estar nesse musical?
N.L.: Sim, movimentou toda a minha vida. Foi graças a ele entrei nesse meio musical, que me coloquei aqui como profissional, como pessoa, e encontrei pessoas maravilhosas, com quem fiz projetos. Além disso, meus amigos são amigos do meio. Enfim, agora que cheguei onde querida, estou achando sensacional. O retorno do público está sendo maravilhoso! Estamos apresentando um trabalho de qualidade muito peculiar. Este musical sai da linha de outros, foi uma escolha ousada, voltada para um público articulado e interessado em um produto cultural diferente. Sinto muito orgulho de ver como a cidade de São Paulo está aceitando esse trabalho!
Q: Como é estar entre tantas mulheres poderosas no palco?
N.L.: É incrível, mas sabe que às vezes me sinto solitário em meu camarim. Acabo importunando elas! São todas maravilhosas, encantadoras e especiais do seu jeito. A primeira vez que ensaiamos a música de abertura, e dei conta que estava vivenciando uma coisa absolutamente rara. Eu me deito no meio delas e elas vem cantando em cima de mim. Foi um choque, lindo e emocionante sentir todas aquelas vozes tão próximas. Tivemos um processo de ensaio esquizofrênico, com metade do elenco em São Paulo e outro no Rio. E, quando juntamos todos, foi só emoção. Aliás, o processo todo foi só emoção: ter Beatriz Segall no palco, as crianças em cena, como a história é contada, a crise que meu personagem vive… É um presente para qualquer ator e principalmente para mim, que sou italiano. Poder apresentar uma história que acontece na Itália, sobre um artista italino, no caso, o Fellini, inspirado em um filme que é um marco no cinema internacional, o 8½, é um orgulho imenso!
Q: É um momento de encontros e reencontros, certo?
N.L: Sim, este é meu terceiro trabalho com a Malu Rodrigues. Temos uma química muito grande, uma relação que transparece em cena. Eu a conheci com 17 anos e vejo que ela é hoje outra pessoa, cresceu muito. E sempre quis trabalhar com a Totia Meireles e Nine foi a confirmação do que eu esperava. Ela é maravilhosa, incrível, tem um alto-astral, não para nunca. Ela tem um número cativante e se relaciona muito bem com a plateia. É um momento em que eu, no canto, a assisto dando um espetáculo no qual as pessoas ficam completamente capturadas pela presença dela. Não conhecia a Myra e ela leva o público ao delírio com a música mais conhecida do espetáculo, a Be Italian. É muito talentosa e com a voz sensacional. A Carol Castro, que vem de outro universo, o da TV, é uma bela surpresa, imprime fortes emoções. A Leticia Birkheuer é sempre divertida, ela se joga. A Beatriz é a Beatriz. O que dizer dela? Ela já entra com um olhar forte e fora de cena é uma figura!
Q: Como surgiu o interesse pela área?
N.L.: Já estava há quatro anos no Brasil e estudava teatro. Assim que me mudei, me matriculei no curso de Artes Cênicas na UniverCidade, no Rio, e também busquei aprender o idioma. Fiquei interessado pelo universo dos musicais porque tenho um histórico relacionado a isso anos atrás, quando morava na Itália e cantava. Tive várias bandas, gravei um álbum. Mas deixei a música um pouco de lado quando mudei para Paris. Morei três anos lá, antes de vir para o Brasil, e comecei a estudar teatro. Fiz as primeiras montagens profissionais lá. O musical foi a oportunidade de eu resgatar essa questão musical, do canto, principalmente, no contexto do teatro.
Q: E a mudança para o Brasil?
N.L.: Eu conheci o Brasil pela primeira vez em 2003, em uma viagem a passeio, e fiquei encantado. Desde então, sempre me questionei: ‘Será que vou para lá?’ Estava morando em Paris e fazia teatro, mas precisava ganhar o pão de outra forma, trabalhava com consultoria. E certa vez pensei: ‘Ou eu saio daqui e ponho os dois pés no mesmo sapato e invisto no que acredito ou não adianta mais’. Foi assim que eu zerei tudo e me mudei para o Brasil.
Q: Tem vontade de trabalhar só na TV?
N.L.: Eu fiz novelas. Meu último trabalho foi uma participação em Boogie Oogie, em que era um empresário italiano. Fiz O Rebu, outro empresário italiano. Estou sempre nesse nicho, já que o sotaque é minha marca registrada. Mas faço fono para ver se consigo sair disso. Tento ter um pé na TV e no cinema, mas sou um bicho de palco mesmo, é mais a minha praia. Hoje eu penso assim, mas as coisas mudam, não é?
Fonte: Revista QUEM – 19/06/2015. Matéria por ANA CAROLINA MOURA. Fotos: GUILHERME ZAUITH. –